sábado, 14 de julho de 2007

Legislação e política de comparticipação de medicamentos
Poupar agora é gastar mais tarde


As sucessivas alterações introduzidas nos últimos anos pelo Governo na política do medicamento poderão, a médio e longo prazo, ter efeitos contraproducentes, que se traduzirão num aumento das despesas com a medicina terapêutica. A eventual poupança conseguida no imediato, através de vários cortes na comparticipação dos fármacos, evidenciará no futuro um encarecimento daqueles produtos, que resulta directa e necessariamente na dificuldade económica na sua aquisição. Estudos que têm vindo a ser divulgados na Comunicação Social atestam que a comparticipação dos fármacos por preços de referência, que entrou em vigor em Março, levará os doentes a quem não forem prescritos genéricos a gastar mais 4,9 milhões de euros do que gastariam na vigência do anterior modelo.

Num artigo de opinião publicado na edição de Julho da revista «O Advogado», Luís Cardoso Rocha analisa as mais recentes evoluções ocorridas em Portugal na área da legislação e da política de comparticipação de medicamentos, para concluir que “os requisitos tradicionais que norteavam a aprovação de novos fármacos para comparticipação, como a segurança, a eficácia e a elevada qualidade, estão agora aliados ao requisito do custo/efectividade”. O Governo justificou as várias medidas que foi implementando nesta área com o argumento da sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde, materializado na racionalização e adequação do esquema de comparticipações, de modo a garantir uma mais efectiva democratização do acesso aos medicamentos por parte dos cidadãos.
No que diz respeito ao regime jurídico da comparticipação, estão regulamentados os critérios que podem ser decisivos para a exclusão da ajuda estatal na compra de medicamentos, tendo o Ministério da Saúde papel determinante, uma vez que é ao gabinete do ministro que compete a definição das listas de produtos farmacêuticos comparticipáveis, cujo elenco deve assentar na exclusão dos fármacos que tenham custo excessivo, duvidosa eficácia terapêutica ou excessivamente onerosa face às alternativas, ou resultados menos expressivos do que os fármacos que tenham sido reclassificados como medicamentos não sujeitos a receita médica. Em Março deste ano entrou em vigor um novo sistema de comparticipação que, de acordo com Luís Cardoso Rocha, poderá representar um aumento da despesa futura, camuflado por um primeiro momento de poupança para os cofres do Estado.
Segundo explica o advogado, o novo esquema de apoio estatal para a aquisição de medicamentos “determina que a percentagem de comparticipação do Estado deixa de ser definida pelo preço de venda ao público daquele produto, para passar a ser calculada a partir de um valor de referência”, correspondente ao custo do genérico mais caro disponível no mercado para a mesma sintomatologia, visando o uso do medicamento terapeuticamente equivalente com menor custo. No entanto, citando estudos recentemente divulgados pelos meios de Comunicação Social, o cronista explica que os doentes a quem não forem prescritos medicamentos genéricos – e ainda são muitos os médicos que se recusam a prescrevê-los – representarão uma despesa anual superior em 4,9 milhões de euros à que teriam no período em que vigorava o anterior regime.
Por este motivo, o advogado aconselha a tutela a “equacionar se as políticas de comparticipação de medicamentos foram efectivamente atingidas”, e de que forma os pensionistas foram afectados, avisando que as várias leis entretanto aprovadas permitem “um jogo de preços, comparticipações e exclusões que podem penalizar seriamente o pensionista ou consumidor final” dos produtos vendidos nas farmácias portuguesas. Considerando que as intenções do Estado serão à partida positivas, nomeadamente em relação aos cidadãos mais carenciados, Luís Cardoso Rocha é da opinião de que “o sistema está bem longe de ser perfeito”, e considera que “um Estado que poupa a curto prazo na comparticipação é necessariamente um Estado que, a médio e longo prazo, vai gastar mais na medicina terapêutica”.

Carla Teixeira
Fonte: «O Advogado», Ministério da Saúde, Associação Nacional de Farmácias