terça-feira, 30 de outubro de 2007

REPORTAGEM

Regime jurídico entra em vigor debaixo de contestação
Novas regras nas farmácias portuguesas


“A evolução da sociedade, o dinamismo das farmácias e as profundas alterações no sector do medicamento”, conjugadas com a já desgastada vigência de uma lei que remonta à década de 60 do século passado, confluíram para o que o Governo considerou ser uma reforma aconselhável. O Decreto-Lei nº 307/2007, publicado em «Diário da República» no passado dia 31 de Agosto, entra nesta terça-feira em vigor, alavancando uma profunda mudança nas regras por que se rege a actividade das farmácias de oficina em Portugal.

Considerando que esta reforma vem pôr fim a “um regime jurídico desadequado e injustamente limitador do acesso à propriedade”, como é referido no preâmbulo do decreto-lei que estabelece a nova norma, a que o farmacia.com.pt teve acesso, o Ministério da Saúde, e através dele o Governo, entendem que a legislação agora revogada “foi aprovada num contexto nacional e europeu que não tem paralelo com a actualidade, pelo que importa adaptá-la à nova realidade da sociedade portuguesa”. A questão da propriedade é tema central da nova lei, tanto mais que a tutela mostra, no texto legal que introduz as novas regras, a firme convicção de que a limitação da propriedade das farmácias, até este momento, à classe farmacêutica terá suscitado “a criação de situações fictícias”, em que um farmacêutico assumiria a posse de um estabelecimento que, na verdade, não lhe pertencia.
Esta presunção do Governo, assumida publicamente pelo ministro da Saúde, teve já ampla repercussão junto dos diversos agentes do sector, que criticaram Correia de Campos por ter insinuado a existência de corrupção sem ter concretizado casos e números, que a Autoridade Nacional do Medicamento e dos Produtos de Saúde (Infarmed) disse desconhecer, pela voz de Vasco Maria, presidente do conselho de administração daquela entidade, mas que a própria bastonária dos farmacêuticos, Maria Irene Silveira, reconheceu existir, tendo até recordado um caso ocorrido há cerca de seis anos, que a própria testemunhou, quando dirigia a Secção Regional de Coimbra da Ordem dos Farmacêuticos.
A questão da propriedade dos estabelecimentos de dispensa de medicamentos parece ser assim o tema mais quente que o novo regime jurídico espoleta, mas a verdade é que as novas regras mexem com muitos outros aspectos da actividade e da profissão farmacêuticas. A entroncar na questão da propriedade, e tal como tem vindo a ser noticiado pelo farmacia.com.pt, está outro assunto polémico: é que, ao aprovar a aquisição de novas farmácias por qualquer pessoa, independentemente da sua profissão, abolindo a exclusividade do farmacêutico, o Governo abriu portas a uma nova polémica, quando declarações do ministro da tutela fizeram ventilar a ideia, entretanto desmentida por fonte oficial, de que os não farmacêuticos seriam, de algum modo, favorecidos nos concursos para compra de novos espaços de venda de medicamentos.
Por outro lado, o novo regime jurídico vem mexer na regulação da direcção técnica das farmácias, vincando a exigência de aquela ser assegurada, em permanência e exclusividade, por um farmacêutico, e também na questão da autonomia do papel do director técnico. São igualmente alterados os pressupostos relativos ao quadro de pessoal das farmácias, horários e requisitos de licenciamento, e são introduzidos os conceitos de dispensa de medicamentos não sujeitos a receita médica através da internet e ao domicílio, aquisição de fármacos através de concurso, prestação de novos serviços naqueles espaços e transferência de farmácias dentro do mesmo município, independentemente da existência de concurso público.
Inicia-se assim, a partir de hoje, uma nova era no sector farmacêutico em Portugal, com o Governo a ousar ir em frente, indiferente à contestação dos vários agentes do sector e de facções políticas como o PSD e o PCP, que chegaram a pedir uma segunda apreciação da nova legislação na Assembleia da República. Este regime jurídico deverá ainda ser complementado com quatro portarias, segundo apurou o farmacia.com.pt junto de fonte parlamentar. Nessas portarias serão definidos os contornos da venda online de medicamentos (dispensa e entrega deverão ser feitas pelo mesmo profissional que as faria na farmácia), tal como o leque de serviços que as farmácias podem oferecer, como imunizações não incluídas no Plano Nacional de Vacinação, campanhas de informação, programas de cuidados farmacêuticos e colaboração nos programas de educação para a saúde.
Ainda antes disso, a nova lei confere aos utentes a possibilidade de reclamar diante de uma eventual situação de mau atendimento, bastando para isso aceder ao site do Infarmed (http://www.infarmed.pt/) e expor o problema, e abre caminho à existência de farmácias abertas ao público em regime de permanência nos hospitais e ao alargamento de horários, nas restantes, para um período mínimo de 55 horas por semana, acabando com a taxa de serviço nocturno que até agora era cobrada aos utentes que se pretendiam aviar as suas receitas médicas fora do horário normal de funcionamento daqueles estabelecimentos.

Carla Teixeira
Fonte: «Diário da República», «O Primeiro de Janeiro», Agência Lusa, Mobifarm, farmacia.com.pt, contactos telefónicos

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