quarta-feira, 13 de junho de 2007

ENTREVISTA


Irene Silveira em entrevista ao «Farmácia e Medicamento»
Resgatar o prestígio da classe

Quiseram lançá-la na corrida à liderança da Ordem dos Farmacêuticos há seis anos, mas nessa altura o cargo de vice-reitora da Universidade de Coimbra impediu-a de dar o passo que ousa dar agora, consciente de que a sua experiência profissional, académica e até política poderá impulsionar a busca do prestígio que a classe vem perdendo. Dizendo-se “uma mulher positiva” e que não foge à luta Irene Silveira parte “com esperança” para as eleições de dia 21: um duelo no feminino…

FM – Por que motivo decidiu avançar neste momento para uma corrida ao cargo de bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, num duelo feminino pelo exercício de um lugar nunca antes atribuído a uma mulher?
IS – Avancei agora, porque só agora encontrei disponibilidade para isso. A verdade é que já nas anteriores eleições, em que foi eleito Aranda da Silva, fui incentivada a candidatar-me, mas nessa altura era vice-reitora na Universidade de Coimbra e não tinha possibilidade de desempenhar as funções de bastonária. No entanto, o apoio e o estímulo dos colegas, por quem nutro consideração e respeito, e o facto de eles continuarem a insistir para que me candidatasse e renovasse a Ordem, fizeram-me pensar nisso agora.

FM – Recentemente teceu algumas críticas quanto ao modo como a actual Ordem tem gerido alguns dossiers, designadamente o silêncio do bastonário em funções no que diz respeito à liberalização da propriedade das farmácias. O que teria feito nesse capítulo se fosse bastonária?
IS – Sou uma mulher positiva e de “enfrentamentos”. Como bastonária teria tomado outra posição nessa matéria. Acho incompreensível que no processo de produção de uma lei que altera as regras da propriedade das farmácias o bastonário da OF não tenha sido ouvido. Nessa e noutras matérias, a actual Ordem poderia ter feito mais, digo eu e dizem todos os farmacêuticos. Há um estatuto da OF que confere determinadas atribuições à estrutura representativa da classe farmacêutica, e uma dessas atribuições é justamente a de dialogar com o poder político e intervir nas políticas de saúde.

FM – Que proposta concreta tem para a questão da liberalização da propriedade das farmácias, agora que esse assunto está em cima da mesa e que o Governo se concedeu apenas seis meses para legislar sobre o assunto?
IS – Proponho fazer o que dizem os estatutos: através de um diálogo construtivo e respeitador, interpelar o poder político, que foi eleito democraticamente para o lugar que desempenha, pelo que as decisões que toma são legítimas. Enquanto Ordem dos Farmacêuticos, eu teria seguido os estatutos e enveredado pela via do diálogo actuante e interventivo, negociando e explorando essa forma de entendimento com o poder político. A liberalização da propriedade das farmácias terá consequências que não serão, de todo, as melhores para a saúde pública, com uma degradação progressiva da qualidade dos serviços prestados.

FM – Acredita que a confiança dos utentes das farmácias poderá perder-se quando atrás do balcão estiver a atendê-los alguém que não é um farmacêutico?
IS – Isso não pode acontecer. Temos de estar atentos aos ganhos em saúde, porque o nosso país é um país pequeno em que o factor económico é importante, mas não podemos pautar-nos apenas por esse aspecto. A regulamentação da propriedade das farmácias tem de ser negociada com o poder político, no sentido de produzir as mínimas consequências para os utentes das farmácias, e de forma a evidenciar a qualidade e a importância do farmacêutico e da sua qualificação processo de acompanhamento e aconselhamento dos doentes. Outras pessoas que se ponham atrás do balcão não terão estas capacidades, que decorrem de anos de formação. É imprescindível salientar, junto das instâncias superiores do poder político a importância do papel do farmacêutico na promoção da saúde, e eu terei, se for eleita, a preocupação de garantir essa intervenção do farmacêutico.

FM – A revisão da actual forma de revalidação da carteira profissional é a grande bandeira da sua campanha. O que importa mudar nesta matéria?
IS – Importa mudar tudo! Desde 1983 que pertenço a um grupo de formadores de farmacêuticos. Estou totalmente de acordo com a necessidade de formação. As pessoas que saem das universidades saem normalmente muito bem preparadas, mas a Ciência evolui a grande velocidade, e preconizo que a formação contínua é muito importante. O que não preconizo, de modo algum, é a frequência de acções de formação que atribuem créditos de um modo arbitrário. É preciso valorizar a experiência diária dos farmacêuticos. As pessoas têm de saber que competências têm de desenvolver e voluntariamente decidir adquirir essas competências. Não pode haver uma obrigatoriedade, por uma questão de créditos, de os profissionais terem de frequentar determinadas acções de formação, que nem sempre são as que melhor servem os seus interesses e os interesses dos doentes. A revalidação da carteira profissional não pode estar veiculada a este sistema.

FM – Alterar o actual esquema de revalidação é, portanto, a grande prioridade?
IS – A qualificação é uma das minhas prioridades, mas não da forma que hoje está considerada. É minha prioridade absoluta reformular o actual sistema, porque esta plêiade de cursos de formação não traz nada de positivo. Outra prioridade da lista B, que encabeço, é a descentralização da Ordem dos Farmacêuticos e o aumento da sua representatividade. Dou um exemplo: não faz sentido que, ao fim de um dia de trabalho, um colega de Castelo Branco tenha de vir frequentar uma acção de formação a Coimbra. É preciso repensar o tipo de cursos, a sua localização e os seus horários. Queremos mudar a Ordem, mas sempre ouvindo os farmacêuticos e reflectindo com eles sobre o que precisa de ser alterado.

FM – Defende também, talvez devido à sua carreira docente, um maior diálogo da Ordem dos Farmacêuticos com as faculdades…
IS – Fui coordenadora do processo de implementação das regras de Bolonha na Universidade de Coimbra. Sei, também por isso, que o diálogo com os estudantes deve ser intenso e muito claro. É muito importante que as pós-graduações e os vários cursos de formação contínua vão ao encontro das necessidades de formação dos profissionais. O ensino e a investigação devem estar ligados com o exercício da actividade profissional do farmacêutico.

FM – Está optimista quanto aos resultados das eleições do próximo dia 21?
IS – Sou uma mulher positiva. Muitos colegas, jovens e menos jovens, decidiram dar-me o seu apoio porque entenderam que tenho competência como docente e como profissional. Reúno a componente teórica com a experiência prática do que é o sector farmacêutico, e tenho tido responsabilidades bastante grandes. Tenho uma enorme ligação ao sector, de quase 25 anos, e tenho o perfil adequado para tratar dos problemas actuais da classe. Além disso, nunca trabalharei sozinha. Há uma vasta equipa que me apoia e espero, se for eleita bastonária, poder contar com todos os ramos de actividade do sector na luta para que a Ordem tenha uma nova visibilidade e uma nova excelência, dando a conhecer e enaltecendo o papel do farmacêutico no âmbito do plano nacional de saúde. É essa a imagem que quero que a Ordem dos Farmacêuticos dê da classe profissional que representa.

Carla Teixeira
Fonte: entrevista à candidata
Imagem: Site da campanha

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